Há algum tempo adquiri esse livro, mas apenas recentemente empreendi uma leitura mais engajada no "História da Civilização - Parte 5 - A Renascença", de Will Durant, e tem sido um deleite página a página, algo que as grandes obras sempre proporcionam, aliás, também por esse aspecto conquistaram o rótulo de grandeza.
O livro começa pelo período do papado de Leão X (1513-1521), que, sobretudo, foi um paladino dos artistas, um grande incentivador das grandes obras. Sob sua influência, Roma tornou-se o coração palpitante da cultura européia, o epicentro para onde alfuíam artistas, letrados, poetas e homens de espírito livre em geral. Oportunamente, poderei distender um pouco mais sobre esse e outros fascinantes capítulos da história da renascença, mas no momento atenho-me à uma específica parte do capítulo seguinte ao de Leão X, intitulado 'A Revolta dos Intelectuais', sub-capítulo III, que discorre sobre o desenvolvimento da medicina naquele período.
Recentemente, num agradável colóquio com uma amiga médica, falávamos sobre alguns aspectos das transformações ocorridas na medicina nas últimas décadas: avanços tecnológicos, proliferação de cursos, banalização da relação médico-paciente, sobrecarga de trabalho e a decadência da figura do profissional no atual status quo, de maneira a ser pertinente e divertida a comparação.
Na Renascença, os médicos receberam grande parcela da nova riqueza da Itália, vindo a ser uma classe de grande influência política. Petrarca, sentindo sua posição e seus benefícios ameaçados, denunciou, cheio de indignação, os altos honorários dos médicos, e a ostentação descabida de "seus mantos escarlates e capuzes enfeitados de arminho, seus anéis ofuscantes e esporas de ouro", e enviou uma carta ao enfermo papa Clemente VI, para que se precavesse contra eles:
Sei que vosso leito está cercado de doutores, e isso naturalmente me causa temor. Suas opiniões estão sempre em choque umas com as outras, e aquele que nada tem a dizer de novo passa pelo vexame de se ver numa situação inferior aos demais. Como o disse Plínio, eles negociam com as nossas vidas a fim de criarem um nome para si através de alguma novidade. No tocante a eles - o que se não dá com outras profissões - basta chamarem-se médicos para que se acreditem em tudo que dizem; no entanto, uma mentira do médico encerra mais um perigo que a de qualquer outra pessoa. Somente uma doce esperança é que não nos faz pensar nessa situação. Eles aprendem a sua profissão à nossa custa. Até a nossa morte lhes fornece experiência. Somente o médico é que tem o direito de matar com impunidade. Ó bondosíssimo Pai, considerai essa bando como um exército de inimigos! Lembrai-vos da advertência num epitáfio que um homem infeliz mandou gravar em seu túmulo: "Morri vitimado por muitos médicos."
Nenhum comentário:
Postar um comentário